Quarenta minutos foi o tempo que o senhor Fernando Rodrigues gastou para, em texto escrito no seu blog hospedado no UOL (aqui), desfilar “facilidades” para a grande parcela da população que não é muito afeita a analisar com calma o que lê ou ouve. E, como sói acontecer com quem se apressa, acaba apenas emitindo uma opinião pessoal, uma achologia, e não uma análise. Mas vamos desconstruir, passo a passo, essas facilidades.

“O pronunciamento da presidente Dilma Rousseff nesta noite de sexta-feira (21.jun.2013) não trouxe nenhuma novidade a respeito do posicionamento do governo federal sobre as manifestações de rua. O mais notável foi seu tom de ameaça em vários trechos quando falou que o governo não vai “transigir” com atos de violência.”

Vejam só como são as coisas. A começar que o “governo federal” não tinha posição alguma sobre as manifestações (a não ser uma breve nota da Presidenta). Logo, o pronunciamento em si já é uma GRANDE NOVIDADE. Aliás, novidade cobrada por todos.

Esse tipo de parágrafo para iniciar um texto mostra claramente que a disposição do autor será somente atacar. É uma técnica conhecida para atrair, de cara, os “insatisfeitos”, para angariar leitores. Não fora isso, que necessidade haveria de começar chamando de “tom de ameça” o que não passa de um posicionamento esperado de uma autoridade quanto aos atos de vandalismo provocados por uma minoria saída sabe-se lá de onde? E será que, em dez minutos de fala não haveriam outros temas para referenciar em um primeiro parágrafo?

Seguindo…

 “Mas o que fez o governo até agora? Há quase duas semanas que as principais cidades do país têm ficado paralisadas no final da tarde.”

Não havia feito nada porque até então não lhe competia fazer nada. Distorce, o articulista, a realidade das competências federativas e tenta imputar uma “culpa”, à Presidenta, que cabe exclusivamente aos prefeitos e governadores.

As manifestações começaram motivadas pelo aumento do valor das passagens de ônibus. Primeiramente em Porto Alegre e, após, em São Paulo. Repito: competências exclusivas dos prefeitos (passagens) e governadores (segurança). Transmitir a ideia de que o governo federal deveria ter se metido logo de cara é, no mínimo, incitar ao golpe que seria praticado pelo próprio governo. Outro nome não há para isso.

Somente quando o teor da pauta das reivindicações ultrapassou a simples questão do preço das passagens; somente quando as manifestações saíram de Porto Alegre e São Paulo, para tomar conta da imensa maioria das cidades brasileiras, é que a questão adquiriu um caráter nacional. Somente a partir desse momento caberia à Presidenta algum tipo de posicionamento. E um posicionamento que não significasse intervenção, mas exatamente o que ela fez.

Segue uma das “pérolas”:

“Como o Brasil é um país conservador, talvez o pronunciamento da presidente possa ter algum efeito tranquilizador em parte da população. Foi uma gravação realizada da forma mais conservadora possível. Em frente a um fundo de madeira, ela usando um blaser de tom amarelo acabou lendo no teleprompter por 9 minutos e 43 segundos. É uma fala muito longa sob qualquer métrica possível. Mas Dilma não tinha saída.”

Há doze anos que a maioria da população brasileira deixou de ser “conservadora”. Conservadores são, hoje, minoria afastada do poder. Afirmar, portanto, que “o Brasil é um país conservador” é usar de generalização para defender um argumento. Mas não foi sem razão essa generalização, pois usou-a para atacar a roupa da Presidenta, mais uma vez distorcendo os fatos.

Dilma tem sido atacada por usar blaser vermelho em seus pronunciamentos. Dizem ser uma clara associação com o PT. Vai daí, que reclamam. Dizem que ela é presidente de todos e não poderia se associar apenas ao PT (partido dela, né?). Pois bem, lembremos que uma das questões chaves para os manifestantes é dizerem que as manifestações são “apartidárias”. Tivemos casos até de violência contra manifestantes que tentaram levar bandeiras dos seus partidos.

Ora, percebendo que se aparecesse “de vermelho” poderia ela mesma ser associada a tudo quanto os manifestantes não querem e desejando aproximar-se deles, nada mais natural que aparecesse em tons neutros. Não tem nada de conservador nisso. Foi bem pensado, como forma de mostrar que não está afrontando e, sim, buscando a aproximação.

Só não entendeu isso, além do articulista, quem está – e somente está – mal intencionado… Sim, Dilma teve outra saída, diferentemente do que faz parecer o autor.

“Em certa medida, o pronunciamento de Dilma tenta recuperar o tempo perdido por ela nos últimos dois anos e meio. Sobretudo quando chegou a dizer que vai se esforçar agora para incentivar uma “ampla reforma política”. Essa expressão “reforma política” chega a provocar ataques de narcolepsia em quem acompanha o mundo do poder aqui em Brasília. Basta haver um problema de qualquer ordem no país que o presidente de turno fala sobre a necessidade de uma… reforma política. Passa a crise ou arrefecem os seus efeitos, a reforma política nunca sai.”

Que tempo foi perdido pela Presidenta? O de incentivar a “reforma política”? Mas será que é papel de um presidente da república incentivar o que deve ser feito pelo Congresso Nacional?

Será que é ela que perde tempo, ou seremos nós, os cidadãos que perdemos, ao não exigir com maior força – nas ruas – que o Congresso faça o dever de casa?

Novamente distorce as competências para imputar uma culpa que não é dela. Sim, ela até poderia se esforçar pela reforma, mas como membro do PT e não como presidenta.  Quem lê o que o articulista escreveu fica pensando que a Dilma já deveria ter mandado um projeto de lei criando a “reforma política”. Ou, quiçá, uma medida provisória…

E a fala foi clara e simples: “Quero contribuir para a construção de uma ampla e profunda reforma política”. Exatamente o que um presidente pode fazer: contribuir. Mas seria, novamente, intervir em outro poder do Estado.

E por que, então,  incluiu a reforma política no pronunciamento? Mais simples do que ficar procurando pelo em casca de ovo. E ela o disse: “Eu quero dizer a vocês que foram pacificamente às ruas: eu estou ouvindo vocês!”

Seguimos…

“Em outro trecho do pronunciamento, a presidente faz uma confusão com algo que ela própria patrocinou. Diz que a Lei de Acesso à Informação “deve ser ampliada para todos os poderes da República e instâncias federativas”. Como assim, ampliada? A lei já vale para todos os Poderes e para governos estaduais, prefeituras e União.

Talvez até de maneira inadvertida, Dilma acabou passando um pito em cadeia nacional de TV em prefeitos e governadores –que, de fato, cumprem de maneira precária a Lei de Acesso. E o que dizer da própria presidente, que acaba de decretar sigilo sobre todas as informações de gastos de suas viagens ao exterior? Como ela própria disse “a melhor forma de combater a corrupção é com transparência e rigor”. Pois é.”

Infantil essa colocação. Qualquer criança que tenha visto o pronunciamento entendeu direitinho o que ela quis dizer com “ampliar”. O articulista não precisava desse recurso para aumentar seu texto. E o pito não foi “inadvertido”, foi proposital, pois sabemos que a imensa maioria dos entes públicos desse pais ainda não disponibilizam informações. E, cá pra nós, a própria mídia só faz estardalhaço no que diz repeito aos salários dos servidores públicos…

E que interessante: o autor parece pensar que é de extrema importância para o desenvolvimento do país saber o quanto é gasto pela Presidenta em suas viagens. Duas questões sobre isso: (1) até mesmo um presidente da República deve seguir as orientações da política de segurança nacional. Não basta que ela bata pé e diga “quem manda aqui sou eu e quero tudo publicado”. (2) O autor pode não acreditar, mas existem sim – desde coisas aparentemente sem razão (caso das viagens) até as mais graves -, informações que podem colocar em risco não apenas a segurança do país, como, e principalmente, a segurança da própria presidente. Acredite se quiser.

E convenhamos: não há nada mais importante para colocar no texto?

Não contente com tudo quanto havia escrito até aqui, parte para uma agressão que beira a pessoalidade:

“Em resumo, quem redigiu e copidescou o pronunciamento não estava muito familiarizado com o governo de Dilma Rousseff. E a própria presidente não fez a revisão necessária daquilo que leu no teleprompter. É desagradável quando ocorrem tantos descuidos em um texto para o qual a petista e sua equipe de marketing tiveram dois dias para produzir.”

Tenho segurança ao afirmar que quem não está familiarizado com a presidenta é o articulista. Quem conhece a loga trajetória pública da Presidenta sabe o quão rigorosa ela é com essas coisas. Jamais, mas jamais mesmo, leria um texto que não tivesse sido “o texto dela”. É natural que assessores preparem minutas a partir de ideias centrais passadas por ela. O parágrafo é de uma infelicidade e de uma desnecessidade total no contexto do que pretende ser uma “crítica”. Na realidade, foi a forma que o autor conseguiu para usar a palavra “petista”. E note-se que foi a única vez que usou, justamente no parágrafo mais ofensivo. Outra técnica pra lá de conhecida…

Leiam os três parágrafos sobre a Copa.

Recomendo apenas o acesso a esse documento do  TCU, onde se vê que do total de investimentos, apenas 17,88% correspondem aos Estados e não “a maioria dos recursos” como mente o autor.

O texto termina de forma melancólica, citando até Fernando Collor. Lamentável, enfim…

 

Luiz Afonso Alencastre EscosteguyBrasil Sem PIGPIGUncategorizedQuarenta minutos foi o tempo que o senhor Fernando Rodrigues gastou para, em texto escrito no seu blog hospedado no UOL (aqui), desfilar 'facilidades' para a grande parcela da população que não é muito afeita a analisar com calma o que lê ou ouve. E, como sói acontecer com...Antes de falar, pense! Antes de pensar, leia!