O comentário da Nívea Ribeiro, no post do Jubal (A Disputa da Água), “acho que a população esta sendo informada do que esta acontecendo,apenas informada.mas muita das vezes, não tem como por em pratica seu conhecimento” aponta para uma questão das mais importantes para a humanidade e que tem me intrigado muito: o que há entre o filosofar e o agir?

Dizem os entendidos que vivemos na tal da Sociedade do Conhecimento. Pura filosofia, pois como bem aponta a Nívea, nada mais temos feito do que disponibilizar informações (e, em boa parcela dos casos, apenas dados). Beira às raias do primarismo ter que diferenciá-los, mas é necessário, visto que, no caso do meio ambiente, a quantidade de informação
disponível está definitivamente dissociada da qualidade. Qualidade aqui entendida como informação realmente capaz de produzir alterações positivas na realidade do meio ambiente e não meramente qualidade no sentido de eficácia. O sentido é ideológico, sem dúvida.

A pergunta básica, então, é: por que somos capazes de produzir tanta informação e tão pouco conhecimento sobre o meio ambiente?

Transformar informações em conhecimento é um ato que implica mudança. Mas, diferentemente do que muito se divulga por aí, essa mudança é, necessariamente, interna. É somente pela mudança de nossas crenças e valores que podemos gerar conhecimento a partir das informações que recebemos. Caso contrário, as informações estão fadadas ao
esquecimento.

E como mudar as crenças e os valores das pessoas quanto ao meio ambiente?

Duas citações para começar. A primeira, do Fritjof Capra; a segunda, mais recente, do Leonardo Boff:

1. “O novo paradgma pode ser chamado de uma visão de mundo holística, que concebe o mundo como um todo integrado, e não como uma coleção de partes dissociadas. Pode  também ser denominado visão ecológica, se o termo ‘ecológica’ for empregado num sentido muito mais amplo e mais profundo que o usual. A percepção ecológica profunda reconhece a
interdependência fundamental de todos os fenômenos, e o fato de que, enquanto indivíduos e sociedades, estamos todos encaixados nos processos cíclicos da natureza (e, em última análise, somos dependentes desses processos).
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2. “Para onde iremos? Nem o Papa nem o Dalai Lama, nem Barack Obama nem muito menos os economistas nos poderão apontar uma solução. Mas pelo menos podemos indicar uma direção. Se esta estiver certa, o caminho poderá fazer curvas, subir e descer e até conhecer atalhos, esta direção nos levará a uma terra na qual os seres humanos podem ainda viver humananente e tratar com cuidado, com compaixão e com amor a Terra, Pacha Mama, Nana e nossa Grande Mãe.

Esta direção, como tantos outros já o assinalaram, se assenta nestes cinco eixos: (1) um uso sustentável, responsável e solidário dos limitados recursos e serviços da natureza; (2) o valor de uso dos bens deve ter prioridade sobre seu valor de troca; (3) um controle  democrático deve ser construído nas relações sociais, especialmente sobre os mercados e os capitais especulativos; (4) o ethos mínimo mundial deve nascer do intercâmbio  multicultural, dando ênfase à ética do cuidado, da compaixão, da cooperação e da responsabilidade universal; (5) a espiritualidade, como expressão da singularidade humana e não como monopólio das religiões, deve ser incentivada como uma espécie de aura
benfazeja que acompanha a trajetória humana, pois ancora o ser humano e a história numa dimensão para além do espaço e do tempo, conferindo sentido à nossa curta passagem por este pequeno planeta.
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Bonito filosofar. Mas faço com a Nívea e pergunto: e daí? Como transformar, na prática, o meu paradgima, se somos, como pais ensinados, responsáveis perante a sociedade por transmitir justamente o paradigma dominante? Se somos as pessoas que continuam a dirigir bêbados, falando ao celular e matando, no trânsito, mais do que se mata nas atuais guerras? Como mudar essas crenças e esses valores?

Por outro lado, a direção apontada por Boff também requer uma mudança mais profunda ainda, pois depende de que mais gente, além de mim, mude seu paradigma, sob pena de que querer um “controle democrático sobre os mercados e capitais especulativos” não
passe de mera … especulação; sob pena de que o “intercâmbio multicultural” não passe, como sempre foi, de um intercâmbio de bombas… Bonito filosofar.

Num mundo onde trilhões de dólares são gastos ou perdidos tão somente para recuperar os “mercados e capitais especulativos”, a miséria e a fome continuam matando crianças,
jovens e adultos.

Há muito mais entre o filosofar e o agir: existem as crenças e valores que adotamos. Devemos oferecer um caminho prático para que as pessoas primeiro acreditem que mudar é possível e que a mudança não lhes causará prejuízo (as pessoas não mudam pensando nas vantagens que poderão obter e, sim, nos prejuízos que poderão evitar); segundo, que queiram mudar, por verem que uma nova crença – esta sim, baseada em uma “ética do cuidado, da
compaixão, da cooperação e da responsabilidade universal”
é boa para todos; terceiro, que seja um exercício (agir) que se adpte facilmente a vida das pessoas e não algo radical como muito das propostas que andam por aí.

Precisamos contruir esse caminho prático, que nos fará sair do filosofar e passar para o agir.

O mundo está sendo destruído pelos que fazem e não pelos que pensam.

Notas:
1Capra, Fritjof. A teia da vida. uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. 13ª ed. São Paulo. Cultrix. p.25.
;2Leonardo Boff. Os limites do capital são os limites da Terra. Agência Carta Maior.

Luiz Afonso Alencastre EscosteguyFaça a sua partePara pensarO comentário da Nívea Ribeiro, no post do Jubal (A Disputa da Água), 'acho que a população esta sendo informada do que esta acontecendo,apenas informada.mas muita das vezes, não tem como por em pratica seu conhecimento' aponta para uma questão das mais importantes para a humanidade e que tem...Antes de falar, pense! Antes de pensar, leia!